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terça-feira, 2 de outubro de 2012

A importância de brincar em idade pré-escolar



























“Privar uma criança de brincar é privá-la do prazer de viver”, Françoise Dolto

Actualmente vive-se numa sociedade em que tudo se faz “a correr”. O tempo é um bem precioso e a gestão do mesmo acaba por ser uma arte de mestria. Esta constante vivência em “correria”, onde tudo é agendado ao minuto, contamina inevitavelmente o dia-a-dia das crianças, preenchido pela presença no jardim-de-infância ou na escola e em inúmeras actividades extra-curriculares. A própria evolução urbanística conduz a uma vivência confinada a espaços físicos restritos e limitados: o apartamento, os edifícios citadinos em que se situam os jardins-de-infância, escolas e pátios de recreio... “Está quieto”, “Não mexas nisso”, “Não te sentes no chão” são apenas algumas das imposições contínuas que bombardeiam as crianças todos os dias. Frequentemente a actividade por excelência que as caracteriza – o brincar – fica esquecida no meio da rotina e da vivência diárias. Ora, durante muito tempo pensou-se que brincar não tinha utilidade biológica ou social, mas na realidade, brincar é a forma de controlo das interacções sociais da criança e um meio poderoso de aprendizagem sobre o mundo. É um dos fenómenos mais comuns e naturais da infância, não específico ao Homem, mas também partilhado com outras espécies. 

A actividade lúdica permite estabelecer um elo de ligação entre as crianças sendo um poderoso auxiliar na construção da relação com os outros e com o meio que as rodeia. Detentora de um papel fundamental no desenvolvimento emocional, cognitivo e social, possibilita a estimulação da criatividade e o desenvolvimento da autonomia, da linguagem e de papéis sociais (fundamentais para a vida adulta), dotando a criança de maiores capacidades para pensar e resolver problemas. De facto, através do brincar a criança vai-se familiarizando com as regras sociais e tomando contacto com experiências novas: ela explora, pesquisa, experimenta e aprende. Experimenta com relativa segurança ou com o mínimo de riscos (porque são situações puramente imaginárias) um novo comportamento familiar em contextos físicos ou sociais diferentes, sendo o comportamento lúdico em grande parte revogável: o que se faz “a brincar” não tem as consequências habituais de um comportamento semelhante feito “a sério”. O jogo é algo com impunidade relativa e características não sérias. Toda e qualquer brincadeira requer que as crianças tenham consciência destes aspectos e que emitam e reconheçam o sinal que “isto é uma brincadeira”.

Brincar permite que a criança se mantenha fisicamente activa, que desenvolva a personalidade e as competências sociais, ajudando-a a lidar com emoções e sentimentos, possibilitando: 

•    encenar experiências emocionais (por exemplo: separação dos pais, situações de luto, alterações significativas na vida da criança, sentimentos de alegria, tristeza, ciúme, medo); 

•    “descarregar” tensões (por exemplo: alívio da dor, desconforto, frustração); 

•    pesquisar (observar, explorar, descobrir); 

•    treinar as competências de autonomia e de independência (actividade espontânea e voluntária, implicando empenhamento activo por parte da criança); 

•    divertir-se (sem objectivos específicos, apenas algo agradável e positivo).

À medida que a criança cresce evolui socialmente de situações em que brinca sozinha, para brincadeiras mais cooperativas. Ser, ter, fazer, tomar, dar, amar, odiar, viver, morrer, todos estes verbos não ganham sentido senão através do jogo. O brincar assume, desta forma, uma preparação para as acções e comportamentos da idade adulta.

Por tudo isto, para além do espaço do jardim-de-infância/escola e das actividades extra-curriculares (predomínio das regras e de momentos organizados/estruturados) é também fundamental:

•    Aceitar e ter em conta o brincar desde o nascimento. Antes do aparecimento da linguagem a criança já comunica com os adultos através da mímica, nos gestos, nas actividades corporais e sensoriais. Por volta dos 3 meses um dos primeiros jogos com o adulto é o de esconder o rosto e mostrá-lo de novo, depois surgem actividades de exploração e manipulação dos objectos do meio, jogos em torno do ter e guardar (encher objectos com coisas que se transportam), e, mais tarde, jogos de fazer coisas (puzzles, construções). A partir da idade em que a criança começa a andar é preciso dar um especial destaque aos jogos com água, areia, ou terra, aos jogos de enchimento e de esvaziamento de recipientes. Este é o momento da explosão da curiosidade investigadora e manipuladora dos objectos, tudo suscita perguntas e tudo se tenta agarrar, despedaçar, fragmentar.

•    Variar os brinquedos da criança. Quando a criança já descobriu as dificuldades de um jogo e as ultrapassou, poucas são as surpresas ou interrogações. É preciso variar os brinquedos e jogos de forma a estimular os sentidos, a criatividade e a inteligência da criança. Pode tentar trocar alguns brinquedos do seu filho/a com outras crianças, ou procurar uma ludoteca na zona de residência/trabalho. (Nota: aqui entendem-se jogos de ludoteca os livros para crianças, os jogos de construção, os jogos de motricidade, inventivos, criativos, de lógica, etc; não são de forma alguma incluídos os peluches, a boneca preferida, enfim, os brinquedos que são “os primeiros amores” da criança, que ela usa para adormecer, ou se acalmar quando os pais estão ausentes).

•    Reforçar a ideia de ter mais “tempo de qualidade” para brincar com o seu filho/a, do que “tempo de quantidade”. São preferíveis 15-20 min., por exemplo, em que apenas está a brincar com o seu filho/a, do que 3 horas em que, no meio de outras tarefas, vai falando e interagindo. Esses momentos podem mesmo ser combinados com a criança de modo a que esta perceba que nesse tempo o adulto vai estar disponível só para si.

•    A brincadeira não deve ter muitos “nãos” (por exemplo: “não corras”, “não saltes”, etc). Para brincar a criança tem que se sentir numa atmosfera segura e de não ameaça, portanto, estar continuamente em guarda perante os pais, educadores ou o próprio meio dificulta a tarefa espontânea de brincar. As crianças precisam de limites para se sentirem seguras, mas isso não significa que não possam exprimir os seus desejos, as suas alegrias e os seus desgostos (que devem ser aceites pelo adulto).

•    Levar o seu filho/a para brincar em espaços ao ar livre em que se efectuem actividades diferentes das realizadas no espaço físico limitado da casa ou do jardim-de-infância/escola. O espaço é para as crianças um desejo muito intenso, é o mover-se, correr, descobrir coisas novas, enfim, sentir a vida em todos os poros. Porém, deve também ter-se em conta que algumas crianças brincam ficando apenas a olhar, ouvir, cheirar, sentir. São prazeres passivos, inteligentes, observadores e por vezes meditativos.

•    Reduzir a pressão na aprendizagem de conteúdos escolares, ainda em período pré-escolar. Nesta fase o que se torna realmente necessário é que a criança brinque, consiga enquadrar-se e socializar com o grupo, que respeite as regras da sala, que aprenda a ouvir os outros, que se concentre numa actividade (jogo, desenho, história, etc.) e que a termine dentro das suas capacidades, que desenvolva a motricidade, a criatividade e a capacidade de pensar sobre as coisas. Basicamente a criança necessita de crescer, ganhar maturidade e competências sociais, para futuramente estar mentalmente disponível para aprender a ler, escrever e contar, quando ingressar na escola.





Por TERESA SANTOS, Psicóloga Clínica

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